da Redação DiárioZonaNorte
Uma injeção direta na veia: “Vocês querem ser mais realistas do que o rei?”. Foi o que ouviu o diretor-técnico de Saúde do Conjunto Hospitalar do Mandaqui, Dr. Marcelo Barletta Soares Viterbo (médico-neurocirurgião), durante seu depoimento na Comissão de Saúde da Assembleia Legislativa de São Paulo, nesta 3ª feira (05/02/2019), presidida pelo deputado Edmir Chedid (DEM).
O diretor do hospital é o atual responsável pelos problemas enfrentados naquele local e, em 19 de dezembro de 2018, dissolveu o Conselho Gestor, em uma reunião rápida de 45 minutos e “de surpresa”. Ficou ali registrado o fim da única via de comunicação e de prestação de contas com a população, usuários e funcionários.
Decisão precipitada
Foi a observação que o deputado estadual Carlos Neder (PT) buscou nos provérbios portugueses, e citou diante de cerca de 60 pessoas presentes no Plenário Tiradentes – caso raro, já que essas reuniões no começo do ano e de nova legislatura (a posse é em 15 de março) não tem boa frequência e, às vezes, nem quórum para início.
A colocação da frase fez um rápido efeito na condução dos trabalhos, já que demonstra que um leigo pensa conhecer mais do que alguém especializado em um assunto. No caso específico da reunião, mostrando que a decisão de dissolver o Conselho Gestor foi precipitada e sem razão no contexto da transparência dos serviços públicos.
O conhecimento do parlamentar
O Dr. Marcelo ficou surpreso, ao lado de sua assistente Dra. Silmara Zolli, na mesa, e teve que engolir o que acabara de ouvir. Mal sabia que sentado na Comissão de Saúde estava o deputado estadual Carlos Neder (PT), de 65 anos, com três legislaturas (e que por causa de apenas 8 mil votos não se reelegeu em 2018 e está na 1ª suplência na próxima legislatura) e que fora o vereador que criou a Lei 13.325/02 dos Conselhos Gestores nas unidades municipais do Sistema Único de Saúde – SUS.
E com mais aval ainda: o deputado é também médico com mestrado em saúde pública pela Unicamp e teve duas legislaturas como vereador, sendo inclusive Secretário da Saúde por dois anos no governo de Luiza Erundina. Com todos esses requisitos, um profundo conhecedor do assunto.
O fim do Conselho Gestor
Mas o fator mais importante da Comissão de Saúde acabou sendo mesmo a questão da dissolução do Conselho Gestor do Hospital do Mandaqui, que aconteceu em dezembro passado. Segundo o Dr. Marcelo, a ordem veio da Secretaria da Saúde que considerou a gestão dos conselheiros inconstitucional, baseando-se em documentos que tiveram um conflito de ações.
O diretor do hospital tirou de sua responsabilidade o ato da dissolução e deixou a determinação aos seus superiores. Mas nesta questão do fim do Conselho Gestor do Hospital do Mandaqui — que gerou a frase do provérbio português – o deputado Carlos Neder reconstituiu os acontecimentos e foi até didático ao explicar os caminhos que levaram à criação e a permanência dos órgãos nos hospitais estaduais.
Os caminhos da lei
Segundo explicou o deputado Neder, o Projeto de Lei do ex-deputado Roberto Gouveia criou os Conselhos Gestores para entidades de saúde não municipalizadas. A Assembleia aprovou a lei, mas foi vetada pelo governador.
Em seguida, a Assembleia através de um substitutivo vetou o ato, o que gerou uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI nº 4000) no Supremo Tribunal Federal (STF), determinando que a iniciativa não podia ser de forma parlamentar.
Somente o Executivo poderia encaminhar o Projeto de Lei para criar os Conselhos Gestores para as unidades de saúde estaduais. E, desta forma, os Conselhos continuam funcionando em vários hospitais estaduais — como os citados de São Mateus e Guaianazes — e não houve um ato do Secretário da Saúde atingindo os demais – e o único atingido foi o Hospital do Mandaqui, sem o aval superior.
Um novo Projeto de Lei
O deputado Carlos Neder lembrou que esse ato de dissolução deveria “vir de cima” dos superiores e não do diretor do hospital, já que somente o Hospital do Mandaqui será o único sem Conselho Gestor. E aí surge a questão: “Como os Conselhos funcionam em outras unidades e não no Mandaqui?”, questionou o deputado.
E acrescentou: “É um instrumento de diálogo de trabalhadores e usuários com a finalidade de ajudar o gestor”. No final da reportagem, o deputado esclarece o assunto e lembra que o Secretário da Saúde pode propor um Projeto de Lei do atual governador João Doria Jr. para regulamentar no âmbito estadual os Conselhos Gestores. E, neste período dos trâmites, podem funcionar com uma resolução do próprio secretário.
Os motivos na Comissão de Saúde
O pedido de esclarecimentos da situação referente ao Conjunto Hospitalar do Mandaqui à Comissão de Saúde se deu por todos os acontecimentos envolvendo aquele equipamento de saúde na Zona Norte, com reclamações que chegaram aos deputados antes mesmo da posse do atual diretor do hospital. Tanto que a convocação foi dirigida à ex-diretora Dra. Magali Vicente Proença.
E também foi convocado o gerente de infraestrutura e operacional do Hospital do Mandaqui, Roberto Claudio Lorche, que assinou a convocação da Comissão de Saúde, mas informou que estaria de férias, a partir de 01 de fevereiro — o DiárioZonaNorte confirmou que ele viajou para os Estados Unidos e retorna no dia 12, e foi substituído por Francisco Basílio de Moraes.
A versão do hospital
Além de resumir os assuntos em seu tempo de explicações iniciais, o diretor do Hospital do Mandaqui teve a oportunidade de mostrar alguns números e ações que foram feitos no Conjunto Hospitalar do Mandaqui, com atendimentos nos Prontos Socorros, ambulatórios, cirurgias e a quantidade de ambulâncias que chegam ao local.
E chegou a justificar pelo lado de que o Sistema Único de Saúde (SUS) está sobrecarregado por causa dos “12 milhões de desempregados”, que deixaram de pagar planos de saúde – que “são vítimas da brutal crise econômica que assola o País”.
Fez também referências à falta de médicos, mas jogou a culpa ao processo de cadastramento e contratação, até por causa do Contratos por Tempo Determinado (CTD) que foram considerados “inconstitucionais” e “não se pode contratar”. E desabafou: “burocraticamente não é fácil”.
O Dr. Marcelo falou também sobre permanência hospitalar por causa de pacientes em aparelhos ou para exames, a falta e a compra de equipamentos – e pediu até ajuda de emendas parlamentares dos deputados. Segundo ele, em 2018 foram sete reuniões com a Prefeitura para que haja atendimentos de ajuda em Unidades Básicas de Saúde (UBS) e AMAS para aliviar o atendimento do hospital, que é terciário. Falou também dos problemas de elevadores (com problemas de acertos entre as empresas Thyssen e Elevadores São Paulo), limpeza do hospital e dos 90 banheiros que teve uma rotina quebrada por sete dias por causa da troca de serviços das empresas envolvidas em contratos.
Onde estão as emendas parlamentares
E chegou ao item da emenda parlamentar de 7,8 milhões de reais da ex-senadora Marta Suplicy, que deu entrada no meio do ano passado, e que o Conselho Gestor não recebeu nenhuma orientação ou justificativa do andamento do processo. Mas agora o Dr. Marcelo esclareceu que finalmente o dinheiro foi liberado no final do ano. “Está tudo ok!”, comentou.
Explicou que foi “muita burocracia”, mas até agora não sabe quando receberá o valor – que tem destinado 4 milhões de reais para compra de equipamentos e 3,8 milhões para reforma do laboratório e um pequeno Centro Cirúrgico para emergências. Neste momento, o deputado Carlos Neder aparteou e perguntou sobre o empenho da emenda parlamentar.
E o Dr. Marcelo demonstrou ignorar esse detalhe, o que foi orientado pelo deputado a procurar descobrir como ficou o empenho, ou seja, a garantia do dinheiro reservado pelo governo anterior, já que as mudanças o valor pode ter ficado congelado. << N.R.: Não se falou da emenda parlamentar de 200 mil reais do deputado estadual Pedro Kaká (PODE) concedida ao Hospital do Mandaqui, por intermédio da Associação dos Amigos do Mirante do Jardim São Paulo e Zona Norte — que também deve verificar o empenho>>
Falta de diálogo e transparência
Um pouco mais da metade da reunião, o presidente Edmir Chedid teve que se ausentar e passou a presidência ao deputado Marcos Martins (PT), que ficou até o final da reunião (*). Em seguida, houve a abertura da participação da plateia, com quatro pessoas.
O primeiro a falar foi o presidente executivo do Conselho Gestor, Marco Antonio Nunes Cabral, que fez um histórico do órgão criado em 24/01/1996 (23 anos) de um ato do Conselho Estadual da Saúde e sua importância na transparência do que acontece no hospital para usuários e moradores da região, além de buscar soluções junto à administração. Deixou claro que não há nada contra a direção do hospital, médicos, enfermeiros ou de funcionários, mas o Conselho Gestor buscou todo esse tempo diálogo e soluções — e que não foi receptivo.
Lembrou que desde a última reforma e ampliação do Hospital do Mandaqui, em 2011, está havendo um sucateamento, sendo que de 30 mil pessoas atendidas na época caiu agora para 11 mil. E ainda colocou que antes havia um diálogo interno com a diretoria anterior (Dra. Magali Vicente Proença), que ainda havia algumas soluções, e que nunca houve um diálogo com a Secretaria Estadual da Saúde envolvendo o Conselho Gestor. “Eu e o Conselho Gestor representamos a população”, finalizou.
Cadê o Conselho?
Depois vieram as participações da ex-conselheira Cirlene Machado (que falou da busca de união do Conselho Gestor com a diretoria do hospital, enfatizando no final o pedido para os deputados ajudarem “no retorno do Conselho Gestor”) e o ex-subprefeito da Casa Verde na gestão de Fernando Haddad (em 2016), o advogado Marcelino Atanes Neto (que além dos elogios à diretoria e ao hospital, fez referências à renovação do Conselho Gestor e afirmou que o Hospital do Mandaqui tem condições de atender 2 milhões de pessoas).
Fechando as participações populares, o inscrito a falar foi Nelson Ferreira Filho, o “Nelsinho”, que pertence ao Conselho de Supervisão de Saúde de Vila Maria/Vila Guilherme/Vila Medeiros e também do Conselho Consultivo da Coordenadoria Norte de Saúde –- desde Jaçanã/Tremembé até Perus/Pirituba –, que chamou atenção para a importância do voluntariado dos conselheiros, que podem ajudar o gestor dos equipamentos de saúde. Segundo ele, é uma instituição colaborativa. Nelsinho disse que esperava ouvir na Comissão de Saúde as deficiências do Hospital do Mandaqui e como isto estava sendo sanado.
Ele sugeriu que a Comissão de Saúde avalie o sistema e os problemas dos hospitais para uma melhoria geral e soluções de problemas. Quanto à dissolução do Conselho Gestor, ele definiu que estava “enchendo o saco”, na concepção do hospital. Mas, segundo Nelsinho, para destituir um Conselho deve seguir normas e leis. E pediu mais diálogo e compreensão para o bem de todos, mas tem que ter o Conselho Gestor. “Só o Mandaqui que não tem?”, encerrou.
Agora, a vez do Secretário da Saúde
O atual Secretário Estadual da Saúde, José Henrique Germann Ferreira (ex-superintendente do Hospital Israelita Albert Einstein), está convocado para o próximo 19/02/2019, 3ª feira, às 14 horas, para prestar depoimento sobre o balanço de ações de sua Secretaria. Na oportunidade, deverá também esclarecer a situação do Conjunto Hospitalar do Mandaqui e da dissolução de seu Conselho Gestor.
O presidente da Comissão de Saúde da Alesp, deputado Edmir Chedid, havia lembrado que “a qualquer momento, os deputados podem ter uma nova reunião, até nas dependências do Hospital, junto à visita parlamentar”.
Mais esclarecimentos
No final da reunião, o deputado Carlos Neder fez os seguintes esclarecimentos sobre as leis e seus encaminhamentos: “O assunto do Hospital do Mandaqui não deve se encerrar aqui, já que no dia 19 teremos a presença do Secretário de Estado da Saúde. Nesta oportunidade, segundo o deputado, poderá haver mais informações sobre a questão do Hospital do Mandaqui e dos Conselhos Gestores”.
E concluindo a participação, o deputado Neder deu mais explicações sobre os Conselhos Gestores: “Quando eu e o deputado Eduardo Jorge fomos Secretário da Saúde da prefeita Luiza Erundina, criamos os Conselhos Gestores na cidade de São Paulo por ato do Executivo. Naquele momento, não tínhamos a Lei Orgânica do Município, ou a Estadual, e desta maneira é que os Conselhos foram criados na cidade de São Paulo.
Mais adiante, quando eu fui vereador, eu propus e foi aprovada a lei dos Conselhos Gestores na cidade de São Paulo. Hoje são mais de 10 mil conselheiros atuando na cidade, só representantes dos usuários.
O Conselho de Supervisão, que foi citado aqui, existe em função da lei municipal. E aí poderiam perguntar: porquê razão a lei que foi criada por um vereador com iniciativa legislativa permanece vigorando e a lei estadual de iniciativa parlamentar do ex-deputado Roberto Gouveia, com meu substitutivo, não vigora mais?
Isto porque a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) foi proposta especificamente em ação a lei estadual e a decisão tomada no STF (aqui está o acórdão) diz respeito exclusivamente à lei estadual. Portanto, os Conselhos Gestores no município, com base na lei aprovada de minha autoria, permanecem vigorando. No acórdão cita a iniciativa de lei parlamentar e a inconstitucionalidade da lei complementar do Estado de São Paulo da lei 12.516 de 02 de janeiro de 2017.
A decisão do STF e a ação que decorreu da Coordenadoria de Saúde da Secretaria diz respeito exclusivamente a essa lei por ela ter sido por iniciativa parlamentar. Conclusão: o que foi feito no governo de Luiza Erundina, nada impede que o atual Secretário de Estado da Saúde, mediante uma resolução, por ser ele membro do Poder Executivo, esclareça como deve funcionar os Conselhos Gestores nas unidades estaduais que não foram ou que não serão municipalizadas
E no dia da vinda do Secretário à Comissão de Saúde pode-se solicitar não só por resolução da Secretaria, ele discipline o funcionamento destes Conselhos Gestores, mas que ele encaminhe um Projeto de Lei para Assembleia Legislativa para que não haja vício de iniciativa por ser de origem do Poder Executivo.
Cabe ao Secretário propor ao governador João Doria Jr. que encaminhe o Projeto de Lei à Assembleia Legislativa criando os Conselhos Gestores. Enquanto isto não ocorrer, nada impede que o Secretário, por resolução da Secretaria, institua os Conselhos Gestores e permita o diálogo democrático no espírito da Lei 8.142 criou esses Conselhos Gestores no Brasil todo. E uma cidade como São Paulo, com mil e quinhentos quilômetros de área, não pode prescindir de um organismo da participação da população e dos trabalhadores, que vai ajudar a gestão do hospital. Precisamos ouvir a comunidade”.
Comissão de Saúde presente
(*) Nesta reunião sobre o Conjunto Hospitalar do Mandaqui teve a presidência dos deputados Edmir Chedid (DEM), na primeira parte, e de Marcos Martins (PT), na segunda parte. Estiveram presentes os deputados Analice Fernandes, Carlão Pignatari, Celino Cardoso, Hélio Nishimoto e Roberto Massafera (todos do PSDB), Carlos Neder (PT), Doutor Ulysses (PV) e Itamar Borges (MDB). << Veja a cobertura da Assessoria de Imprensa da Assembleia Legislativa com matéria publicada no Diário Oficial – Legislativo, na capa ao lado – clique aqui >>
Reportagem da Tv Alesp == A repórter Silvia Garcia, da Tv Alesp, gravou entrevistas com o deputado Carlos Neder e o Presidente do Conselho Gestor do Hospital do Mandaqui, Marco Antônio Nunes Cabral, junto a uma retrospectiva de alguns pontos da reunião. Na saída do plenário, o diretor do Hospital do Mandaqui, Dr. Marcelo Barletta Soares Viterbo, recusou-se à entrevista: “Sou funcionário público e não estou autorizado a falar. Peça autorização para a Assessoria de Imprensa da Secretaria”. E a assistente Dr. Silmara Ziolli recomendou à repórter: “Me dê seu telefone que aviso para quem você deve procurar”. E foram-se. <<Essa reportagem do Jornal da Alesp no YouTube ou Web (apresentado por Sérgio Ewerton – de 2ª a 6ª feira, ao meio-dia) pode ser assistida aqui neste link >>
“O direito de informar”
Sem citar o “DiárioZonaNorte” – onde fez somente a referência de “um veículo de mídia regional” – colocou também críticas às reportagens sobre o Hospital do Mandaqui. E, como já publicado anteriormente nas duas últimas reportagens, o “DiárioZonaNorte” divulgou uma Nota de Repúdio no tratamento que recebeu e sobre a “liberdade de Imprensa” que busca esclarecer aos moradores e leitores o que realmente acontece na região, com “responsabilidade e ética profissional”, com base em reuniões do Conselho Gestor, reclamações de leitores e usuários do hospital, como também fontes fidedignas.
Caso Conselho Gestor na Rádio
O programa “Metrópole em Foco” da Rádio Trianon AM 740, apresentado pelo jornalista-radialista Pedro Nastri e produção de Duda Jr., apresentou no dia 01/02/2019 (6ª feira) o “Caos no Hospital do Mandaqui” e o que aconteceu com o Conselho Gestor. No estúdio, o presidente do Conselho Gestor, Marco Antônio Nunes Cabral; a presidente da Associação Amigos do Mirante e Zona Norte, Alba Medardoni; e o advogado Dr. José Valentim Contato. – Clique aqui para ouvir a íntegra do programa com 2 horas de duração.