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Fé cega, faca amolada

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Tempo de Leitura: 3 minutos

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da Redação DiárioZonaNorte

Um tipo de apito mais agudo e intenso soa no meio da rua. É mesmo para chamar a atenção e avisar que o “amolador de faca” está chegando às ruas da Zona Norte. É o Sr. Arlindo Pires Barbosa. “É o pessoal brinca comigo, na gozação, lá vem aquele ‘amolador’…”, comenta o Sr. Arlindo. Mas ele tem orgulho da profissão, que praticamente está extinta.

Não é como antigamente, que era comum as pessoas terem principalmente uma faca de boa qualidade – na maioria, importadas da Alemanha ou da Suíça – e que duravam uma eternidade.  E, segundo o Sr. Arlindo, hoje nem quase existe mais concorrência. É também um trabalho cansativo e com pouco retorno.

Com os seus 60 anos de idade, o Sr. Arlindo anda por mais de 50 ruas diariamente, que nem imagina o que significa isto em quilometragem. E até brinca, “nem preciso me preocupar em fazer ginástica em academia, pois já tenho as minhas caminhadas”.

DE JALES PARA SÃO PAULO

Ele nasceu no interior paulista, em Jales, a quase 600 quilômetros da capital. E aos 9 anos já tinha a profissão de “amolador de faca”.  E depois a família teve que mudar-se para Jundiaí.

Neste período, ele estudou e fez cursos técnicos, sendo mais tarde admitido na profissão de eletricista na Companhia Paulista de Força e Luz – CPFL, em Campinas.

E lá ficou por 20 anos e teve que sair da empresa por causa da saúde de uma das filhas, que precisava de tratamento médico com urgência e ele usou todo o seu dinheiro da indenização trabalhista. “Não tinha jeito, eu precisa do dinheiro e a saúde da minha filha era mais importante”, acrescenta ele.

O Sr. Arlindo não demonstra cansaço e está sempre atento à sua freguesia fixa pelas ruas. Sabe onde está a sua cliente, fala o nome e reconhece a casa. Conversa sempre ali no portão da casa, na calçada, montado em cima de uma máquina de amolar.

FERRAMENTA DE TRABALHO

Na verdade, ele montou tudo em cima de uma bicicleta desmontada e que transformou algumas partes para o giro do eixo no “rebolho” (onde fica a pedra de amolar). Ele continua morando em Jundiaí e de lá vem todos os dias para São Paulo, no trem com viagem de duas horas e meia. Sai de lá às 6 horas da manhã e chega em São Paulo por volta das 08h30.

No Tucuruvi, por volta das 9 horas, retira a “máquina de amolar”, que fica guardada na casa de um amigo.  Assim,  seu apito começa a soar pelos bairros do Tucuruvi, Parada Inglesa, Jardim Brasil, Jaçanã, Tremembé,  Horto Florestal e muitos outros. Normalmente o seu trabalho termina por volta das 16 horas, retornando à sua casa por volta das 19 horas.

Mas com o seu jeitinho de caipira, ele tem muita honra de nascido no interior de São Paulo e é fã de música sertaneja, quando consegue um tempinho para ouvir nos finais de semana. E de preferência as antigas duplas como Pena Branca & Xavantinho, Tonico & Tinoco, Vieira & Vierinha e tantos outros.

O JEITINHO DO INTERIOR

E lá em Jundiaí tem a sua casa com as suas “hortinhas”, que ele mesmo planta e sabe que é tudo natural e saudável. Tem alegria de ver – “e brincar nos finais de semanas – com os seus quatro netos e ter uma das suas filhas como cabeleireira em um shopping de Campinas, “onde tira bem para o sustento da família”.

O tempo vai passando, o Sr. Arlindo não quer ficar parado. Quer andar, tocar o apito e levar a vida nesta profissão, onde ainda tira um pouco pela sobrevivência, já que não tem aposentadoria. Uma tesoura, uma faca, um alicate… e por aí vai indo com as suas clientes, de rua em rua. Ele cobra 5 reais por peça amolada. “É… preciso andar muito, muito mesmo, para tirar alguma coisinha até o final do dia”, esclarece o Sr. Arlindo.

ÀS ORDENS

E quem precisar de um serviço bem feito e de responsabilidade é só vê-lo pelas ruas da Zona Norte. E ele se preocupou em não ficar fora da “modernidade” e no bolso de sua jaqueta verde, um celular de número 9-9594.0704 pronto para ser atendido. E aqui termina o perfil de um importante personagem da Zona Norte, que “ama essa região”

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