por Beto Freire (*) — Artigo quinzenal n. 29 – < Cidadania >
O anúncio retumbante da “Operação Cracolândia” veio na esteira os novos Centros Temporários de Acolhimento ( CTA’s ) nos bairros adjacentes ao centro, como Vila Maria, Vila Guilherme, Parque Novo Mundo, Pari, Canindé e Belém.
Acompanhados de um discurso humanitário de equipamentos menores para melhor atender os moradores que vivem ao relento. A balburdia cotidiana na região central — afetando o comércio da Rua Santa Ifigênia –, com movimentação forçada dos usuários no centro e sinais de varrição dos problemas para debaixo dos bairros, deixou moradores e comerciantes em estado de alerta.
Critérios adotados na escolha dos endereços e espaços para os albergues foram inclusive motivo de protestos em algumas regiões da cidade, com destaque para a Vila Maria, Vila Guilherme e Parque Novo Mundo. Mesmo assim, houve a inversão de valores e os moradores não são ouvidos e ficam com politicas ineficientes.
A legítima reação
Esses moradores se mobilizaram em abaixo-assinados, faixas de questionamentos, reuniões com políticos e autoridades, bloqueio da Marginal Tietê para que a grande mídia tivesse conhecimento de suas reivindicações — inclusive com helicópteros girando suas hélices em cima das cabeças preocupadas dos manifestantes.
Enquanto contribuintes questionavam o poder público, “autoridades competentes” alegavam uma certa dose de exagero que misturava ignorância e aporofobia da população. Discursos com viés técnico/religioso foram direcionados inclusive ao DiárioZonaNorte, o único periódico que vinha ouvindo ambos os lados e emitindo opinião baseadas em informações sem perder a imparcialidade da notícia.
Questionamentos como as contrapartidas em descontos de impostos para imóveis na circunvizinhança dos CTA’s nunca foram diretamente respondidos, assim como não houve respostas e retorno para a equalização de infraestrutura em saúde e segurança pública.
Previsões de desvalorização dos imóveis, impacto nos comércios e crescimento de moradores em situação de rua tanto nos bairros como próximo aos albergues também foram ignorados pelo poder público. O medo da sair às ruas, de voltar à noite dos estudos e um passeio qualquer que é imediatamente abortado.
Uma voz que mostra a realidade
Enquanto o DiárioZonaNorte trazia matérias embasadas em experiências de outras localidades e relatos de moradores e comerciantes, parte da classe politica não se dava por achado e colocava emissários “influencers” para fazer contraponto ao óbvio…
A Secretaria Municipal de Assistência e Desenvolvimento Social (SMADS) enviou representantes em reuniões do Conselho Comunitário de Segurança (CONSEG) da Vila Maria, sempre tentando convencer e acostumar a comunidade com o fato consumado dos albergues sem estudos de impacto de vizinhança, social e econômico.
Em uma destas reuniões, uma representante da SMADS praticou informações incorretas para desmoralizar as reportagens do jornal. Essa pessoa inclusive citou um estudo de vulnerabilidade, sem indicar qual a fonte, a fundação responsável, e os critérios utilizados nesse tal estudo. Mas, por outro lado, ela também reforçou a necessidade de politicas públicas conjuntas em segurança e saúde equilibrar o convívio social.
Tudo muito bonito, quando verbalizado, na pratica o resultado é trágico. Os moradores não estão inventando e o jornal busca informações com responsabilidade, ouvindo os dois lados, dentro da ética profissional. No ar e no dia a dia das famílias dos bairros e das Vilas, o que impera é a insegurança.
Proibido ver o que acontece
Por outro lado, a Prefeitura da Cidade de São Paulo, através da SMADS, não deixa o publico conhecer a parte internas dos CTAs, somente com autorização antecipada e acompanhamento oficial. Foi o que aconteceu com o presidente do CONSEG Vila Maria, que foi impedido de entrar no albergue localizado no bairro para conhecer os serviços oferecidos.
Inclusive, a Imprensa não recebe convites para reportagens internas nos CTAs, com liberdade de entrevistas aos assistidos. O recurso dos jornalistas é ouvir os assistidos do lado de fora e ao redor dos prédios, nas ruas ou embaixo dos barracos improvisados com papelão, o que já foi mostrado nos telejornais.
Nenhum morador da cidade, que paga seus impostos, quer estar na pele deste pessoal em situação de rua, nem mesmo passar algumas horas nos CTA´s. São humanos e Filhos do mesmo Deus, mas os albergados são recolhidos em horários rígidos para entrar e devem sair logo pela manhã. Tem morador de rua que é recolhido em CTA na Vila Maria ou Parque Novo Mundo, que acaba ficando pelas ruas próximas, durante o dia, ou retorna ao centro — ou na Praça da Sé ou diretamente na Cracolândia.
O que se pede é mais transparência nos atos públicos, com os moradores sendo ouvidos. E nos espaços que são escolhidos tenha um estudo mais sério e aprofundado, se os locais escolhidos serão de segurança para os moradores e de condições humanas para os moradores de rua.
Sugestões não faltam. Uma delas é buscar um terreno em local apropriado, nas Marginais e nos diversos terrenos pertencentes à Prefeitura de São Paulo. Se ali não for, buscar os galpões industriais que estão fechados na mesma região da Zona Norte.
Com isto, dar melhores condições para que essas pessoas possam passar o dia todo, sem horários rígidos, para conviver com pessoas semelhantes. Mas tendo uma assessoria social e de saúde, com atendimento 24 horas. E dar orientações educacionais e de empreendedorismo. É ir além do Projeto Reencontro — que deve continuar em outros lugares, com planejamento junto aos munícipes — dando atendimento aos que não tem famílias.
Mas tudo parece algo inacessível, dentro dos imaginários, mas com o dinheiro dos munícipes sendo o financiador de aventuras. Com isto, em pouco tempo os índices de furto cresceram, as moradias precárias em volta dos albergues apareceram.
Em contrapartida, não aconteceu nenhuma politica de isenção de Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana (IPTU), Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISS) e Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) ficou perdido no caminho das gavetas, sem destino aos nossos bairros e vilas. Não houve também aumento proporcional do efetivo da Policia Militar para prevenção de crimes, tão pouco aumento da estrutura física e humana da rede Sistema Único de Saúde – SUS.
Com a realidade posta, cabe aos leitores que são contribuintes e eleitores fazer avaliação e posteriormente o julgamento eleitoral das ações e omissões dos nossos governantes. E não deixar de lutar, reivindicar e buscar melhorias para a região, inclusive participando de todas audiências públicas dos projetos municipais. Juntando forças é sempre melhor do que ficar reclamando onde não há ouvidos.
(*) Beto Freire — Antônio Roberto Freire é o nome oficial, com batismo de família genuinamente portuguesa, nascido e criado na Zona Norte, nas bandas da Vila Guilherme e Vila Maria. Cronista das Vilas, um apaixonado pela Zona Norte, sendo ativo colaborador há muitos anos do DiárioZonaNorte — escreve quinzenalmente. Com olhar de ativista social, preocupado com a melhor qualidade de vida de todos os moradores, sem distinção, já teve participações em muitas audiências públicas. Por outro lado, foi membro em gestões do Conselho Comunitário de Segurança-CONSEG de Vila Maria, além da presidência da Associação dos Amigos do Parque Vila Guilherme-Trote (PVGT).
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Nota da Redação == (*) O artigo acima é totalmente da responsabilidade do autor, com suas críticas e opiniões, que podem não ser da concordância do jornal e de seus diretores.
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