Verdade
Brasil, 2004. Dólar a R$ 2,80. Maior crescimento do PIB em 10 anos. Na tentativa de ocupar um assento permanente no Conselho de Segurança da ONU, o Brasil assume a liderança das Forças de Paz no Haiti, a chamada MINUSTAH, cujo primeiro comandante foi o general Augusto Heleno, tendo permanecido no cargo até meados de 2005. Logo depois de ter sido comunicado da sua exoneração, ele comandou uma ação na favela Cité Soleil, que foi classificada como um massacre.
Haiti. 05 de julho de 2005. Um dia antes da ação.”
Esta é uma das cenas iniciais presentes em VERDADE, escrito e dirigido por Alexandre Dal Farra, para o premiado grupo Tablado SP (novo nome do Tablado de Arruar). Se revezam na interpretação dos personagens reais (com nomes verdadeiros) os atores André Capuano, Alexandra Tavares, Clayton Mariano, Gabriela Elias e Nilceia Vicente.
As sessões gratuitas acontecem no Centro Cultural São Paulo (CCSP), de 14 a 31 de julho de 2022, de 5ª a sábado, às 21 horas, e domingo, às 19 horas. Em agosto, VERDADE fará apresentações gratuitas na Oficina Cultural Oswald de Andrade.
Assim como na trilogia Abnegação (2014-2016), que olhava criticamente para o PT, e no espetáculo Branco (2017), que abordava a questão da branquitude, em Verdade o grupo dá continuidade à proposta de debater questões políticas polêmicas e extremamente atuais.
Agora, a dramaturgia se debruça sobre momentos decisivos da história recente, ficcionalizando os fatos. A obra é resultado de pesquisa coletiva de mais de dois anos, em que o Tablado SP organizou debates, leituras cênicas e outras ações, com o apoio da Lei de Fomento para a Cidade de São Paulo.
Os personagens no palco
Estão na peça, além do já citado General Heleno, outras figuras do Exército Brasileiro como os generais Hamilton Mourão, Eduardo Villas-Boas, Enzo Peri, Maynard Santa Rosa, Sérgio Etchegoyen, Carlos Alberto Santos Cruz, Edson Pujol e o coronel Paulo Malhães. E também personalidades da esquerda como no embate entre o ministro Aloizio Mercadante (Clayton Mariano) e a presidenta Dilma Rousseff (Alexandra Tavares), quando da assinatura da lei que veio a instaurar a delação premiada.
O foco é a atual militarização do poder em curso no país. No palco, são tratadas questões políticas tendo como objeto de estudo as estratégias contemporâneas utilizadas pelos militares brasileiros para a ocupação do poder no Brasil, cuja gênese remete à Lei da Anistia (1979) e à Comissão da Verdade (2011-14). Por isso, VERDADE busca olhar para os militares, com sua estrutura, a partir de hipóteses.
Um dos conceitos que veio à tona ao longo da pesquisa, e que norteia a escrita da obra, é o termo ‘guerra híbrida’, uma “guerra por procuração”, em que os verdadeiros agentes do conflito permanecem invisíveis, e que já está em andamento no Brasil, com o avanço de militares em várias esferas do Poder federal, de forma silenciosa, sem chamar a atenção.
Costurando a vida real com a ficção
Saídos das páginas de política de qualquer noticiário recente, é no teatro que o público terá contato com ações que compõem estratégias que alguns identificam como sendo parte de uma guerra híbrida – no caso, efetuada para dentro do próprio país. Trata-se da tentativa de entender como se deu a ascensão do atual conservadorismo no país, a partir da ótica das Forças Armadas.
Tanto a encenação, quanto a dramaturgia da obra se instauram por meio de um olhar que procura supor acontecimentos, situações, maneiras de pensar. Com um pressuposto documental, a obra narra momentos concretos da história recente do Brasil. “Evidentemente que não tivemos, e não teremos, acesso ao que realmente ocorreu nesse dia, nessa sala de comando. Então, nos pusemos a imaginar hipóteses, para esta situação, e para todas as que se seguem”, explica Dal Farra.
“O que o ponto de vista dos militares poderia nos dizer? Esta, a pergunta central que VERDADE procura se colocar, sem ironia, sem pressupostos, sem julgamentos, sem certezas. É, no entanto, só depois de um bom tempo de peça, onde vamos como que tentando retirar as camadas mais conhecidas, as nossas certezas sobre os militares, descascando-as aos poucos, e só depois é que se torna possível, talvez, tentar de fato imaginar algo do seu olhar sobre nós”, continua o diretor.
Desfiando um fio histórico
Em cena, os atores vestem máscaras de látex, representando velhos genéricos – para transformar aqueles personagens em entidades algo impessoais, talvez fantasmagóricas. Ao retirarem as máscaras, os atores assumem então personagens reais – por exemplo, Nilcéia Vicente ora faz o papel de General Heleno, ora do Villas Boas, passando pelo Etchegoyen e por Bolsonaro. No entanto, o desencaixe entre ator e personagem nunca se perde, mantendo-se sempre explícito o gesto de se tratar de uma hipótese para algo que não temos como conhecer de fato.
As situações narradas iniciam-se em 2005, no quartel da MINUSTAH, no Haiti, em uma sala de comando, quando o general Augusto Heleno dá às suas tropas as diretrizes para uma ação em Cité Soleil que depois será considerada como um massacre. E vão até o dia 6 de setembro de 2019, quando o então candidato à Presidência Jair Bolsonaro é vítima de uma facada em Juiz de Fora (MG). Quase sempre, o ponto de vista pretendido é do Militar.
Além da encenação, fazem parte de VERDADE recursos cênicos como projeções – de fotos, vídeos, reproduções de notícias de jornais etc. – e uso de off para situar o espectador qual é a situação encenada e quando ela aconteceu.
Serviço – “VERDADE”
Temporada: de 14 a 31 de julho de 2022
- Horários: 5ª a sábado às 21 horas e domingo, às 19 horas.
- Local: Centro Cultural São Paulo – Sala Ademar Guerra – Porão
- Endereço: Rua Vergueiro, 1000 – Paraíso – São Paulo
- Localização: Estação Vergueiro – Linha-1/Azul
- Ingressos: Gratuitos – Retirada na bilheteria, 1 hora antes da sessão
- Duração: 90 minutos
- Recomendação: 14 anos
- Lotação: 80 lugares
Ficha técnica
- Texto e direção: Alexandre Dal Farra
- Atores: André Capuano, Alexandra Tavares, Clayton Mariano, Gabriela Elias e Nilcéia Vicente
- Cenário: Alexandre Dal Farra, Stephanie Frentin e Camila Refinetti
- Luz: Wagner Antonio
- Figurinos: Victor Paula
- Produção: Corpo Rastreado – Leo Devitto
- Idealização: Tablado SP
Este projeto foi realizado com o apoio do Programa Municipal de Fomento ao Teatro para a Cidade de São Paulo – Secretaria Municipal de Cultura.
<<Com apoio de informações/fonte: Canal Aberto Assessoria de Imprensa / Daniele >>