da Redação DiárioZonaNorte
O barco furou! E o comandante não sabia de nada. Mas as bóias salvas-vidas foram lançadas ao mar, na última hora. Foi o que aconteceu com a notícia que a Prefeitura Municipal de São Paulo estava planejando a transferência da Cracolândia para um terreno próximo da Zona Norte – onde anteriormente houve uma favela e, mais recentemente, depósito de material da Iluminação Pública, a Ilume, ligada ao governo municipal.
Ninguém esperava uma reação tão grande dos moradores da Ponte Pequena/Armênia e da Zona Norte lotando o Salão de Eventos do Santuário Nossa Senhora da Salette (Rua Dr.Zuquim – Jd. São Paulo), na noite de 5ª feira passada (25/10/2018) com mais de 400 pessoas durante a reunião da Associação dos Amigos do Mirante (Associação dos Amigos do Mirante do Jardim São Paulo e Região) e da Ordem dos Advogados do Brasil-subseção Santana.
A mudança de rumo
Com acontecimentos antecedentes, no mesmo dia, culminou com o recuo do governo para abertura de um diálogo com uma Comissão de Representantes/Caso Cracolândia, composta por moradores da Ponte Pequena/Armênia e região, mais da Zona Norte – envolvendo comércio, shoppings, escolas, faculdades, rodoviária e outros prestadores de serviços.
Isto acontece agora já que o governo municipal não realizou um estudo de impacto no local e não avaliou o que a transferência da Cracolândia pode influir no entorno atingindo a Ponte Pequena/Armênia e Canindé, com reflexos de falta de segurança e de qualidade de vida em toda região incluindo a Zona Norte. (Mais detalhes – clique aqui ).
O protesto nas ruas
Apesar do dia com garoa fina e temperatura mais baixa, os moradores da região levantaram mais cedo. Aconteceu a manifestação de cerca de 100 pessoas na mesma 5ª feira (25/10/2018), desde às 06h30, que tomou as ruas da Ponte Pequena, próxima da Armênia, chegando ao trânsito da Av. Santos Dumont esquina com a Av. do Estado.
De forma ordeira e de respeito, motoristas e pedestres puderam ver as faixas e cartazes: “Você sabia que o prefeito quer criar uma Cracolândia aqui”, “Repúdio à Cracolândia aqui” e outros.
Aos gritos junto ao megafone de “Cracolândia e CTA aqui não”, com apitos e bexigas, a manifestação retornou até a Av. Cruzeiro do Sul, próxima do terreno que é alvo da Cracolândia. Tudo isto pode ser mostrado também no telejornal do meio-dia da Tv Globo, com a repórter Sabina Simonatto, que registrou o movimento – ver reportagem – clique aqui.
Um fator decisivo
Mas a 5ª feira de manhã preparava um novo e certeiro golpe. Durante um evento no Parque Novo Mundo, o DiárioZonaNorte esteve na cobertura jornalística, com a presença do prefeito Bruno Covas. Depois do evento, o prefeito concedeu entrevista coletiva para os representantes da Imprensa (Estadão, Folha, CBN, Tv Gazeta, Jovem Pan e outros) sendo que o DiárioZonaNorte aproveitou a oportunidade para perguntar ao prefeito o que ele poderia falar sobre a transferência da Cracolândia para a Avenida Cruzeiro do Sul.
Bruno Covas inicialmente nada falou, assustado com a pergunta, e foi salvo pelo Secretário Municipal de Desenvolvimento e Assistência Social (SMADS), Filipe Tomazelli Sabará, que estava logo atrás. “Quem pode falar é o Filipe!” e saiu fora. O secretário confirmou que está havendo estudos para o local, mas ainda nada definido. Mas que está havendo um processo para melhor acomodação dos dependentes químicos com o bem estar e o melhor atendimento.
E, de imediato, o DiárioZonaNorte quis saber porque os moradores e outros interessados (proximidades da Rodoviária, shoppings, escolas, universidades e outros de grande movimento) não foram consultados ou convidados em reuniões ou audiência pública.
O secretário Filipe Sabará simplesmente pulou a questão e disse que “os moradores e todos serão comunicados”. Ao lado, o prefeito ficou ouvindo atentamente. Depois as perguntas giraram em torno de outros assuntos e não foi dada continuidade ao caso Cracolândia.
Novos rumos no Caso
Essa intervenção junto ao prefeito Bruno Covas – que deu a impressão de não estar informado sobre o assunto — parece ter dado outro rumo ao Caso Cracolândia. Sem mais e nem menos, a surpresa da noite foi a chegada do Secretário Especial de Relações Sociais, Milton Flávio M. Lautenschiager, bem antes do início para “dar uma palavrinha” sobre o assunto – mas avisando que não poderia ficar muito tempo e pediu para falar logo no começo.
Mas acrescentou que o Chefe de Gabinete da SMADS, José Castro, estaria presente e ficaria o tempo todo. No final da tarde, o DiárioZonaNorte ainda cobrava a resposta da Assessoria de Imprensa da SMADS para definir se o Secretário Filipe Sabará ou o Chefe de Gabinete compareceriam à reunião, mas a resposta era vazia: “estão em reunião e não há nenhuma definição”.
Os representantes à mesa
Com a coordenação de Beto Freire, a reunião teve início com os convidados e representantes “legítimos e diretamente envolvidos no assunto”, que sentaram-se à mesa: Alba Stella Matos Medadorni (presidente da Associação Amigos do Mirante); Dr. Cláudio Moreira do Nascimento (presidente da Ordem dos Advogados do Brasil-Subseção Santana); José Castro (Chefe de Gabinete da Secretaria Municipal de Desenvolvimento e Assistência Social); Dra. Joana D´Arc Figueira Cruz (advogada, moradora há 30 anos na Ponte Pequena e representante dos moradores); Noemi Silveira (socióloga e cientista politica — que morou na região da Cracolândia, com experiência sobre o local); Capitão da Policia Militar James Carlos, da 3ª Companhia do 9º Batalhão/Zona Norte; e o Padre Marcos Almeida (Reitor do Santuário de Nossa Senhora de Salette).
A reunião aberta
A presidente da Associação Amigos do Mirante, Alba Medardoni, abriu a reunião e deu a fala ao Secretário Milton Flávio – que tinha outro compromisso e pediu para antecipar sua palavra.
Ele tentou amenizar o assunto da transferência da Cracolândia para a região da Zona Norte, que “era uma notícia sem fundamento”, e disse “que os contâineres foram levados ao terreno provisoriamente para serem devolvidos à empresa”.
Mas ele abriu a oportunidade de ser criado uma Comissão de Representantes da Zona Norte para debater o assunto com o governo municipal. Em dado momento e para garantir a promessa, Milton Flávio referiu-se “quem está aqui não é o Milton Flávio e sim o prefeito Bruno Covas”.
O Secretário fez considerações sobre as ações do governo e as melhorias para todos, caindo no mesmo samba de outros carnavais. E foi embora, largando na mesa, o Chefe de Gabinete da SMADS, José Castro, que mais tarde confirmou a Comissão de Representantes para debater o assunto. Ele pediu para que a Alba Medardoni providencie o mais rápido e a colocação de quantas pessoas necessárias para as reuniões.
As falas e os problemas
Após a saída do Secretário, Alba Medardoni se mostrou preocupada com a questão da saúde mental dos dependentes químicos – além do deslocamento da Cracolândia para a Av. Cruzeiro do Sul.
Segundo disse:”como uma pessoa confinada em uma área, dentro de um container, pode ser recuperada? Passando frio, calor… e por estar naquela área e situação é rotulada por todos, principalmente pelas autoridades que preferem confiná-las a encarar o problema de frente e realmente fazer da situação uma politica de saúde pública”.
E colocou que se tem a impressão que a transferência da Cracolândia atende interesses de especulação imobiliária. E referiu-se à falta de diálogo dos governantes e políticos para discutir interesses da população.
Houve a fala do Dr. Cláudio Moreira do Nascimento, que ficou mais em cima dos direitos e da legalidade da ação da Prefeitura, onde poderão ser tomadas medidas judiciais. Os demais convidados da mesa reforçaram o assunto e a situação do local, que poderá trazer sérias consequências.
A retirada e o protesto
O Chefe de Gabinete da SMADS, José Castro, também antecipou sua fala e bateu em pontos anteriores do Secretário Milton Flávio, quase repetitivo. Contou a estória dos contêineres, o esforço de trabalho e preocupação da SMADS com os dependentes químicos e reafirmou que, a partir de agora, a sua secretaria aguarda os nomes que vão compor a Comissão para a marcação das reuniões. E, mais adiante, resolveu ir embora e foi vaiado pela plateia, com pessoas que o seguiram até o estacionamento – sendo protegido pela Policia Militar.
Mais cidadania
O momento é outro. O povo está retomando a cidadania dos nossos antepassados. Está mais participativo circulando abaixo-assinados e mandando confeccionar faixas e cartazes.
E precisamos exigir maior participação nos assuntos do poder público. Como aconteceu em uma rua de Pinheiros (“Moradores barram Asfalto Novo”- Folha de S.Paulo – 08/04/2018) que a Prefeitura mandou asfaltar uma rua de paralelepípedos sem consultar os moradores.
Não deu outra: na madrugada, os moradores protestaram e proibiram o serviço. A Prefeitura recuou e a rua continua do jeito que estava. É o que aconteceu neste segundo caso com a “Cracolândia”, que o poder público vai ter que discutir com a sociedade a conveniência ou não da transferência.
De um modo geral, devemos ter maior participação cobrando dos vereadores, deputados estaduais, deputados federais e senadores a participação da população nos projetos e outros encaminhamentos. Não podemos ficar somente vendo o que acontece. Criar e estimular as participações populares.
Acesse a galeria/portifólio com mais fotos da reunião, manifestação nas ruas e bastidores com convidados — clique no link aqui.
(*) Representantes, empresários e lideranças da Zona Norte presentes na reunião: Policia Militar de São Paulo, Policia Civil, Guarda Civil Metropolitana, Shopping D, Instituto Federal/Escola Técnica Federal, Colégio da Policia Militar, Igreja das Almas, Terminal Rodoviário do Tietê / Socicam, Universidade Sant´Anna, Shopping Center Norte , Novotel LarCenter/ ExpoCenterNorte, Associação Paulista dos Cirurgiões Dentistas (APCD), Cia. Metropolitano de São Paulo (Metrô), Campo de Marte, Ericsson, Colégio Luiz de Marilac, Parque da Juventude/Biblioteca de SP, Escola Técnica de São Paulo (Etec), Distrital Norte/Santana da Associação Comercial de São Paulo, Distrital Nordeste/Vila Maria da Associação Comercial de São Paulo, Conselho Comunitário de Segurança-CONSEG da Vila Gustavo/Parada Inglesa/Tucuruvi, CONSEG-Vila Guilherme/Jardim São Paulo, CONSEG Água Fria/Mandaqui/Tremembé, CONSEG Vila Amália/Cachoeirinha/Imirim, CONSEG Jaçanã/Tremembé e outras representações na região.